O Canibalismo Amoroso
Affonso Romano de Sant'Anna
Romance e comunicação linguística
Editora Rocco
324 páginas
Escrever para não desejar. Não desejar para não se tornar o
objeto vítima da mulher castradora, do mito da vagina deitada, da mulher
aranha, e da serpente venenosa que nos vem da antiguidade: a Esfinge sufocando
os impotentes; Echidna, metade serpente e metade mulher; Charibdes – mulher
sanguessuga engendrada pela Mãe Terra; Empuses e Keres ninfas vampiros, Afrodite Andrófoba assassina de amantes; Harpias
eram as mulheres-demônio, Medusa Górgona castradora; Walkírias na castração erótica mortal; a maldade
devoradora de Kali, Lilith e Eva.
O desejo masculino... e, o corpo da mulher como mero objeto
de consumo. Talvez perpasse por aqui a história do desejo masculino dramatizado
através da poesia. Tendo poetas como guias sobre as fantasias eróticas do homem
– não da mulher – do homem comum. Textos que servem de reflexão atuando como
espelhos de almas que mostram, e, expõe o que lhes vai de mais íntimo, através
da arte da poesia.
Subtítulos do romance/ensaio O CANIBALISMO AMOROSO tem sugestivos arroubos poéticos: “Ofélia e o
Cisne no espelho líquido da morte”, “Do Pan violador ao Arlequim sedutor”, “O
macho castrador reage ante a mulher ameaçadora”, e por ai vai. São frases de
efeito de clara envergadura criativa.
Logo de cara, a cada capítulo, vem uma sentença que é o
resumo da ópera capitular que depois será devidamente desenvolvido ao longo do
ensaio.
A ideia é localizar em textos literários aquilo que vai pelo
inconsciente. Algo como a ideologia amorosa, neuroses individuais que se
transformam em alucinações coletivas, provocações do imaginário. Mas, o poeta
alavanca suas alucinações com o que escreve;
pode, também, representar o inconsciente coletivo da comunidade onde
vive e que passa a ler, mostrando como é seu mundo.
Veremos aqui a importância do corpo feminino que tem mais expressão
que o masculino. O corpo da mulher é mero objeto, por isso, expressão por que
exposto. O corpo da mulher é o campo de exercício do poder masculino. Vemos
aqui uma disparidade entre real e imaginário. Estaria Platão correto ao dizer
que desejar é estar indigente, pedinte, esmoler, carente?
E através da literatura nos vem o temor de Eva e o amor de
Maria. Medo de amar e a incapacidade de vencer fantasmas antigos, perdidos no
tempo da memória e da raça humana. A mulher é o outro. Mas pode ser o espelho.
Nela está a imagem do mal e da desagregação. O padre que ama a cigana tem que
matá-la para não expor-se, mesmo que sofre pela morte dela.
Levemos em consideração que as épocas usam códigos e se
expressam através deles. Vênus como modelo, ou então a enigmática Esfinge, a
temática da noiva morta, cadáveres de virgens e Ofélias; o definhar dos amantes
ante os caixões. Uma epidemia do imaginário, a junguiana alucinação coletiva,
sempre a dualidade da santa e da prostituta, a fragmentação dionisíaca e
órfica, entre a “mulher única” e “todas as mulheres”, a grande liberação
erótica dos anos 60.
A verdade é uma mulher atrás de um véu, e, cabe ao pensador
viril despir, possuir ou violentar esse ser desejável e desejante com seu logos
espermáticos. Mas, que a mulher fale por si, que ela pensa e escreva de si, que ela aja, atue e tenha
atitudes. A Psicanálise pode ser o fio
condutor para seguir os caminhos dos conhecimentos antropológicos,
sociológicos, históricos e literários. Freud
e Jung, Melanie Klein ou Lacan,
“A grande questão... para a qual não encontrei nenhuma resposta durante trinta anos de pesquisas sobre a natureza da mulher é a seguinte: O que querem elas enfim?”. FREUD
O canibalismo do título é um importante traço na cultura
brasileira. O cristianismo representante, no Ocidente, da ordem canibal
ancestral: vejamos, a ceia do Amor e o
ritual da hóstia – a vítima sacrificial - são uma
atualização do rito onde deuses comem homens, homens comem
deuses, ou, então, são dramatizados no sangue dos animais mediadores.
O canibalismo como ritual pode ser visto, por exemplo, na
era cristã. Os epiléticos, em Roma, bebiam o sangue quente dos gladiadores, e o
médico do Papa Inocêncio VIII recomendou- lhe sangue de três crianças de dez anos.
Comer a mulher, o abate da mulata, sedução órfica e
dionisíaca.
Evoé, Baco!
Olá, tudo bem?
ResponderExcluirConfesso que não tenho muita vontade de ler esse tipo de livro, mas achei super interessante!!!
Beijos!
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